quinta-feira, 30 de junho de 2011

Xenofobia Alternativa

Da série “Coisas que aprendi quando entrei na universidade”



Tá. É até legal dizer que você estuda num lugar onde cerca de 90% dos seus professores têm doutorado e outros 10% têm ou estão concluindo o trabalho de mestrado.

A UFG vem crescendo muito no país e a Escola de Engenharia Civil tem sido responsável por diferentes e importantes obras, como a reforma de Angra I, por exemplo.

Como diz o Lucas: O grande desafio para se entrar na faculdade.

Essa é a parte que o povo vê. A parte de que o povo sabe.

Mas no submundo, nos escombros da sala 3, as coisas não são boas. Nem fáceis.  

Uma das coisas que minha mãe me dizia era: “Filho, você vai entrar na faculdade e vai conhecer muitas pessoas diferentes, de cabeça aberta. Então, você tem que ter a cabeça aberta também, assim sua vida vai mudar e mudar pra melhor.”

Ela diz pra eu abrir minha cabeça, mas se eu a abrisse mais, ela provavelmente surtaria e acharia que eu uso drogas. De boa.

Então segui a vida, normalmente, sabendo que eu veria pessoas de todo tipo: estrangeiros, hippies, anarquistas. Enfim, todo tipo.

O primeiro grupo de pessoas que você acha que nunca vai odiar é o dos estrangeiros. Todos eles têm cara de perdidos no país e de que são super gente boas. Até porque, quando você é calouro, acha que os únicos estrangeiros são os alunos de intercâmbio.

Aí, meu amigo, você se fodeu lindamente.

Primeira aula de Geometria Analítica, na sala 3: muitos calouros reunidos, sentados, todos um perto do outro, rindo e conversando (calouro sempre anda em bando e rindo) até que o professor chega na sala. Todos se calam, naquele ato de ensinomedismo, de aluno uniforme e robótico.

Eis que surge um homem de meia idade, de pele levemente morena e de meia altura. Gordo e peruano.

Pelo fato de ele ser gordo, a primeira coisa que você pensa é que ele é gente boa, porque a maioria dos gordos é gente boa, então você acha que não vai ter problemas com ele. Até que o cara começa a falar em espanhol sobre equações impossíveis de Navier-Stokes, as quais são resolvidas por matrizes. Aí ele passa mil matrizes no quadro, põe uma letra grega (Nabla) no quadro que ninguém conhece e começa a pagar de fodão. Gordo só faz gordice.



Os professores de engenharia, aqueles que vão te ensinar algo útil para a sua vida como empregado, são gente finas. Passaram por tudo isso que você passou e, então, procuram te guiar àquilo que é necessário e útil.

Já os caras da matemática são putos com a praticidade dos engenheiros e sua falta de paciência para admirar a bonita matemática, ou até mesmo porque a Engenharia é a profissão que mais dá dinheiro, segundo um estudo da Universidade de Georgetown. É por isso que eles, os matemáticos, pagam de fodões e tão donos da verdade.

Tudo bem que o cara tem doutorado pelo IMPA (Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada), mostrou uma solução para uma equação impossível (através de matrizes) de Navier-Stokes. Isso não dá direito ao cara de vomitar coisas que nós não entenderíamos. Não mesmo.

Na UFG, o curso de engenharia civil não tem Álgebra Linear no primeiro semestre. O FILHO DA PUTA INSISTIU EM BASEAR TODA A GEOMETRIA ANALÍTICA EM ÁLGEBRA LINEAR. NÓS NÃO SABÍAMOS O QUE ERA ÁLGEBRA LINEAR, POR QUE NÃO ENSINAR CARTESIANO, PROFESSOR?

“Porqué cartesiano és mucho trivial”, ele deve pensar.

O cara não se recusaria a descer ao nível dos alunos, ao nível da porra do livro didático que ele adota, para que os alunos pudessem aprender. Não. Ele tem que dar de uma forma humanamente impossível de se compreender, uma forma que só complica e mostra o quanto a matemática pode ser inútil se você não a sabe toda.

Foi isso que o cara fez por um semestre. Deu coisa até de AL 2 pra gente.

Resultado: ninguém aprendeu porra nenhuma.


Graças ao Matheus, a maior parte da galera conseguiu tirar 8,0 na segunda prova, que tinha dez questões e você tinha de escolher quatro para resolver. Alguns nerds são fodas e conseguem essas coisas, tipo tirar 8,0. Eu não colei e tirei um seis e meiozinho honesto. 

Mas o próprio Matheus não sabia o que estava fazendo, apenas fazia. Bem robotizado.

A sorte é que o cara tem a fama de não reprovar ninguém. Acho que é por isso que ele continua dando aula. Os alunos não têm coragem de reclamar dele porque passar na matéria é praticamente garantido. Se você tá fodido, sua nota mínima fica na média; se você não consegue fazer a prova, ele passa um trabalho e de te dá uma notaça, que eleva sua média geral.

Assim, ninguém reclamou e deixou o cara seguir um semestre falando num portunhol horrível, olhando pros próprios peitos.


Na hora de passar, o cara para de dar aulas e passa por e-mail dois longos trabalhos sobre Cônicas e Quádricas. Ninguém sabia resolver. Todos copiaram. Pedimos prum cara formado em matemática fazer uma parte do trabalho e assim, todos passamos.

A cópia da cópia da cópia...



Aí hoje, em plena aula de cálculo, ouvi um boato que me fez querer escrever este. 


O tal peruano seria o professor de Cálculo 2. Em nível de aprendizagem, todos nós já odiamos a idéia, mesmo o livro sendo bom, no caso o do Stewart, o cara tem o dom de complicar as coisas. Mas passaríamos garantidamente para o Cálculo 3, sem sabermos nada.

Será que compensaria, então, deixar o cara vomitar na nossa cara de novo?

Acho que não. 

Se faculdade é lugar de gente de cabeça aberta , você pode lutar pra mudar a situação. Só queria ver muita gente largando o comodismo e usufruindo do direito. Depois ir na coordenadoria do curso pedindo pro cara vazar.

Só, porque apesar de o cara não ser argentino, ele é um pé no saco na vida de todo mundo.


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