quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Suicídio

Esperou aquilo por muito tempo.

Não o deixavam sozinho em hipótese alguma. Sua face denunciava algo. Sabia disso. Sabia também que todos viam isto, mas teimava em esconder dos outros suas dores internas. Eram suas. Sabia de suas limitações. Sabia que lhe privavam a vida, corroíam-lhe o pulmão e destruíam cada feixe muscular do coração.

Acostumara-se com as máximas dores da vida. Precisava delas para viver. Agora não queria mais sentir dor.

Morrer de tristeza? Não. A morte é o fim do sofrimento, é a chave para a alegria. Não o queria fazer perto dos outros. O sofrimento era seu. Queria sua morte apenas para si. Sentiu-se egoísta. Devia mesmo ser. Queria que seu último momento fosse apenas seu.

Lembrou-se de Deus como um sacana, que põe as pessoas no meio da miséria e as controla com o uso do Pão e Circo. A maioria dessas pessoas temem um inferno e se limitam a aceitar o que lhes é imposto, sem pensarem.

Mas o pior está aqui, na terra, no ar, na Terra. Dentro da sua cabeça. Este é o inferno. E quando você percebe isso, descobre que você não vale nada, é mais barato que um abutre podre. Mais insignificante que uma pilha velha.

Viver com essa ideia na cabeça mostra a sua fraqueza, suas incertezas, suas dúvidas, nas quais ninguém nunca pensa. Encontram alguém para aliviarem o sofrimento, para esquecerem que a vida é difícil, inconscientemente.

E quando não se encontra alguém? Ou pior, quando se perde alguém?

Você perde sua única fuga da realidade e fica aprisionado no seu próprio mundo podre. Aquele mundo em que ninguém consegue ficar. Aquele mesmo mundo que sempre dizem ser o mundo dos loucos.

Louco é viver uma mentira.

E ao pensar nisso, escondia seus sentimentos de tudo e de todos. Fingia um sorriso, uma cara alegre, por mais que isso lhe custasse o fígado, mas sabia que apesar da dor, ele se regeneraria. Uma pena ser assim apenas com o fígado.

Agora estava sozinho, então escreveu:
“Me desculpem por causar tanta dor a vocês, mas minha vontade de viver é muito maior do que tudo isso. Preciso me libertar das garras que me prendem, viver consciente, sem dores, por mais que isso se signifique o vácuo. Não há dor no vácuo. Obrigado por cada um de vocês, que sorriram para mim nos momentos de desgraça. E lembrem-se, aqui viveu um homem que sabia de suas limitações e cuja única ambição era viver.”

Sentou-se na cadeira. Sozinho. A solidão lhe trazia o conforto. Não queria que alguém presenciasse aquilo.

Tirou da gaveta a arma e abriu a boca. O cano gelado causava arrepios até na alma. O suor se misturava com a lágrima, roubando-lhe todo o calor do corpo. Riu por dentro. Esse calor significava ainda alguma vida.

E ali olhou para aquele pedaço de metal e viveu como nunca vivera antes.

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