quinta-feira, 28 de julho de 2011

O Auto do Compadre Sílvio

À espreita, como um leão fica de sua presa, ao lado de sua poderosa máquina pega-mulheres

Não. Nossa amizade não é escrita em três atos, porque se assim fosse ela teria um fim. E ela não tem.

Mas infelizmente, egoísta que sou, para falar o que quero, tenho que falar de mim.

Sempre fui intrometido mesmo. Acho que foi por isso que nós nos tornamos amigos.

Se eu não saísse por aí, metendo meu dedo em qualquer lugar (não pensem trocadilhos, seus filhos da puta, o texto é sério), não teria me sentido no direito de lhe mandar tomar no seu respectivo cu, quando muitas vezes reclamou da sua vida, quando nós não éramos nem amigos.

E aí eu fico imaginando o que você pensava de mim. Um cara arrogante e prepotente, que você confirmou anos depois ser a imagem que você tinha de mim, vir do nada e dizer que a vida tem de ser vivida, quando você, jovem Werther , duvidava disso.

Foram longas discussões, nas quais eu tive a grande oportunidade de comparar a vida a uma melodia de música, comparação esta que nunca mais serei capaz de repetir. E após tudo isso, aquilo que antes era apenas um duelo de retóricas, tornou-se um sentimento fraternal, na qual eu não queria que você desistisse. Não tão cedo.

Anos depois, num réveillon em que ambos estávamos sozinhos nas nossas respectivas casas, eu acabei descobrindo que eu me preocupava com você, assim como um pai se preocupa com um filho. Descobri que tenho e que gosto disso. De me envolver demais, de ser tão intenso com as coisas.

Deve ser por isso que eu mandei Forever Young do Bob Dylan pra você. Foi quando nos tornamos amigos de verdade. Companheiros. João’s de Santo Cristo. E eis que sempre servimos de base um ao outro. Você discorrendo sobre suas coisas feias e eu sobre as minhas, um lamentando mais que o outro. Mas nunca perdendo a oportunidade de sacanear, de trollar.

Assim, eu ainda imagino que essa discussão que nós tivemos na semana passada não passa de um troll, na qual um vai olhar para o outro e dizer “Pff, você achou que era sério?”. A falta de humildade de ambos nos fez dizer coisas pesadas um ao outro e, sinceramente, vai tomar no seu cu por ter feito isso. É, tô esperando você me mandar ir também...

O real é que eu não consigo falar nem um terço do que eu quero. Porque amizade é assim, um sabe do outro sem que seja preciso uma palavra. Mas ainda me sinto na obrigação de lhe dizer uma: desculpa.

Não quero que essa merda que aconteceu, ainda mais a porra da matemática, atrapalhem esses nossos poucos anos de amizade (ainda), porque, querendo ou não, você é feio pra caralho e eu não sou didático por MSN, mas nós somos amigos.

quinta-feira, 14 de julho de 2011

Saindo de uma fossa bem servida

Seu telefone toca.

De uma hora para outra, tudo aquilo que você pensou que fosse durar para sempre acabou. Todos seus sonhos que estavam pendurados no varal, a secar, caem com um simples vento, ao final de uma única ligação. Você chora. Tenta entender. Não consegue. Aí o destino lhe dá um tapa na cara e diz “Não entenda, apenas aceite”.

E o que é que você faz? Tenta entender.


              Sempre existem músicas sertanejas para afogá-lo em desgraça ajudá-lo a superar

Nessa busca pelo entendimento, você fecha sua cabeça. Não consegue se lembrar de um defeito se quer. Nada. Encuca que seu namoro era perfeito e que provavelmente há algo de errado com o mundo, para que ele acabasse assim, tão repentinamente.

É aí que começa o problema. Repentinamente, de uma hora pra outra, é o caralho.

Sempre houve indícios. Sempre houve momentos em que você mesmo pensou que fosse acabar ou até desejou que acabasse, por cansaço. Mas não tinha acontecido, não até agora. O desgaste do relacionamento desgastou vocês dois, com o tempo, até que aquilo ali tivesse de ter um fim. Nada de repentino.

Mas você é cabeça-dura. Fica enfurnado dentro de casa, tentando se isolar de tudo aquilo que o afasta de sua amada. Venera e idolatra todas as suas boas memórias, como se só elas existissem, como se isso diminuísse a sua saudade. Briga com todos os amigos que o mandam seguir adiante. “Como assim, seguir adiante? Ela é a mulher da minha vida. Não vou perdê-la.”.

E é com todo esse egoísmo que você descobre que está fodido. Na merda. Ou pelo menos é o que você acha. Todos dizem que é hora de seguir em frente. Você quer muito seguir, mas se fecha a qualquer oportunidade. Como seguir, então?

Primeiro passo: você não é o Mr. Catra. Essa é uma coisa que você consegue aceitar e entender facilmente. Você não é patrão. Por isso, não é porque o seu namoro acabou que você tenha que se revelar o maior putão do universo, pegador de todas as mulheres e passador de pica na cara das mesmas.

Ela dá pra nóis, que nóis é patrão
Já o segundo passo é maior. Bem maior. Envolve toda uma experiência de vida.


Encarando o fim do relacionamento e se redescobrindo


Você não vai conseguir, mas seria essencial que entendesse que sua vida não acabou simplesmente porque ela entrou com o pé e você com a nádega esquerda. Tá doendo, eu sei. Dói demais. Mas a vida não vai parar porque seu coração está partido não, querido. Tanto ela quanto o suposto amor da sua vida estão pouco se fodendo pro seu estado emocional.

Mas entenda que não é porque as coisas são assim que você deve ser um outdoor ambulante que irradia felicidade. Geralmente, sofre mais aquele que tenta mostrar o quão bem está após a separação e como isso foi bom para a sua vida. Acredite: ninguém sai bem de um término, mas a vida segue.

E é nesse seguir que a primeira coisa que você deve fazer é: deixar a sua ex-namorada livre. Se um relacionamento acabou é porque não dava mais. Não naquele instante ou até mesmo nunca mais. Como já dizia minha falecida vozinha “Quando uma mulher quer, nem o diabo consegue impedi-la”. Então, deixe-a ir. Não se prenda a ela. Não a busque. Deixe-a viver a vida que ela não teve com você.

Outra, ouça seus amigos. É quando você tá na merda que descobre quem é verdadeiramente amigo e quem não o é. A maior parte dos seus colegas, que não aguentam ouvir você chorando por uma menina 24/7, logo somem e o deixam ainda mais sozinho. Porém, aqueles outros, que ficam do seu lado, falando coisas que você não quer ouvir, só querem o seu bem. Muitos deles já passaram por tudo isso que está passando, então é uma experiência válida. Muitos, às vezes, precisam machucá-lo para que você perceba onde está. Só fazem isso, porque é algo que apenas eles teriam coragem de fazer. Só eles o conhecem suficientemente bem para dizer o que é necessário.


                                          I'm gonna die with a little help from my friends

Deixando a dita-cuja livre e ouvindo seus amigos, você estará a um passo de se redescobrir.

O fim de qualquer coisa na vida é sempre um choque e é justamente por isso que ficamos perdidos, sem ações. Você acaba se esquecendo de quem é, de quem sempre foi e se lembra apenas de quem era dentro do seu relacionamento, como parceiro. E assim, ver os seus amigos acompanhados dói, sobrar numa pizzaria também, assim como todos aqueles outros programas pra onde é arrastado. Você fica chato e cabisbaixo. Seu único assunto é a sua musa do verão, aquilo que ninguém mais aguenta escutar.

Você a libertou, mas não consegue se livrar das algemas que o prendem. Aí fica difícil seguir em frente, né?

É por isso que você também tem que se deixar livre. Parar de ter pena de si mesmo e aceitar que algumas coisas na vida não foram feitas para durar para sempre. Parar de se culpar pelo fim. Parar de se ver apenas ao lado dela e começar a se ver. Não com outra, nem sozinho. Começar a se ver como você sempre se viu e viveu até o dia em que encontrou alguém. Encontrar aquele cara que ficou guardado dentro do baú por seja lá quanto tempo. Aquele cara engraçado, que sabia fazer a galera rir, que se divertia e que era feliz.

Quando encontrar, você deve se reconhecer nele. Aí você vai descobrir, nesse mesmo cara, um homem completamente diferente, com uma bagagem de experiências muito maior, muito mais apto para enfrentar o mundo.

A partir do momento que você se reconhece e se aceita da forma que está, sem ela, abre as portas da vida com um pontapé muito mais forte do que aquele que tomou no início do texto, botando o pau pra quebrar e se abrindo a novas oportunidades.


Bem vindo ao admirável mundo novo


Estar aberto a novas oportunidades não significa procurar desesperadamente por elas. Se você já está bem consigo mesmo, pra que entrar no desespero para encontrar alguém?

Premeditar essas coisas é sempre um fracasso. Você idealiza uma mulher perfeita, que virá recompensá-lo por todos os males que passou, por tudo aquilo que o fez sofrer e que se entregará a você da mesma forma que você se entregou, quando se fodeu. Olha a responsabilidade que colocou em suas mãos, será que ela aguentaria isso?

A resposta é não.

Você não consegue tomar conta nem do seu coração e já quer que ela lhe entregue o dela? Não é assim que funciona. Expectativas baixas, recompensas altas. Não espere demais, não procure demais. Deixe as coisas rolarem.

Uma coisa que descobri é que o inesperado é uma coisa muito foda. Quando as coisas acontecem sem que você esteja procurando por elas, parece até que elas são melhores aproveitadas. Essa história de que o beijo de outra mulher vai amargar, que você vai ficar brocha, é tudo mentira. Não amarga porra nenhuma. É só você estar pronto para isso, caso uma loiraça bata na sua porta, pedindo pra entrar.

Posso entrar, gatinho?

Não adianta procurar um novo amor sem que você se ame primeiro. Aprendi isso da maneira mais difícil. A partir do momento em que você se ama o suficiente, descobre-se um homem de riquezas e bom gosto, como diria o Mick Jagger, e aí você se vê capaz de encontrar uma princesa linda, que adora tomar uma cerveja com você.

E aí, meu amigo, quando isso acontecer, você foi a primeira pessoa que superou uma grande perda e nem viu. Então para de se lamentar e use este grande choque como impulso para viver a porra da sua vida.



Nota: Eu sei que caí no lugar comum, dizendo tudo aquilo que vocês se cansam de ouvir. Mas era tudo que  eu tinha pra dizer. Qualquer coisa que não fosse isso aí seria uma mentira, então ao invés de inovar, eu preferi dizer aquilo que todo mundo sabe, mas que ninguém faz. Outra, prometi dedicar esse texto a duas pessoas, mas termino aqui dedicando a todos os meus amigos. Vocês são fodas.

segunda-feira, 11 de julho de 2011

O vestido sujo de porra


Andava apressada.

Sua raiva do mundo a guiava para a lavanderia, que ficava a uns dois quilômetros de casa. Cabisbaixa, apertava contra o peito a lembrança da melhor foda que tivera até ali.

Agora, quando seu salto parecia querer perfurar a calçada, não sabia se deveria guardar essas lembranças. Já fora obrigada a guardar todos os presentes e os sonhos em relação ao futuro em cima do guarda-roupa, onde não os visse.

Mas algumas coisas não saíam de sua cabeça.

Como aqueles olhinhos, mais fundos que o normal, circundados por sobrancelhas extremamente bem desenhadas... Ou aqueles lábios finos, de uma boca bem pequena, rodeados por uma barba mal feita.
Não conseguia esquecer.

Mas agora, essa imagem tinha o perfil de um cafajeste. Um cafajeste que terminou por telefone, com a desculpa de que não era bom o suficiente para ela. Um cafajeste ainda capaz de mandar flores, como se isso melhorasse sua imagem.

Mas ela sabia que não melhorava. “Indigno filho da puta” era o que pensava. Porque só a falta de dignidade faz alguém acabar, pelo telefone, com toda uma intimidade construída, por todo o carinho e tesão compartilhados. A verdade é que ele não teria coragem para terminar pessoalmente, não olhando em seus olhos. Não mesmo.

Os homens são assim. Quando vêem que a sua individualidade está ameaçada, fogem. Têm medo de serem tocados lá no fundo e por isso rompem relacionamentos com a maior frieza e com a maior distância possível. Na cara dura.

E agora, tudo que ela queria era sentir raiva. Mas não era assim. Não iria nunca negar tudo aquilo que ele um dia representou, porque na época, era tudo que queria. Não se rebaixaria ao seu nível, de ter jogado a camiseta suja de batom no cesto de roupas sujas. Não. Não pisaria nas próprias memórias.

Perguntava-se se devia mostrar algo para ele. Como por exemplo, rasgar pétala por pétala de cada uma das rosas que recebeu e mandar de volta, com um bilhete escrito “Vai se foder”. Mas para que se preocupar com alguém que está pouco se fodendo?

Pouco se fodendo não. Agora deveria estar fodendo todas, porque pelo menos isso ele fazia bem.

Seu passo estava mais acelerado do que nunca. O vestido não ousava mexer naquelas garras que o prendiam. Seus olhos mareavam lágrimas, como de costume, lágrimas de amor. Era o seu maior dom. Chorar por amor.

Masoquista. É o que ela era. Uma masoquista retardada.

E é por isso que não conseguia parar de se lembrar de quando chegaram da boate e transaram em cima do balcão de mármore da cozinha. Não a mais longa, mas a melhor foda que já tivera. Com toda aquela paixão que só o sexo consegue expor. Que só os arranhões conseguem provar. Que só a vontade faz. E tamanha era a vontade que ela nem teve tempo para tirar seu vestido. Seu melhor vestido. Que agora estava lambuzado de porra seca. Então ela tinha que chegar o mais rápido possível na lavanderia, para lavar essa merda de vestido e seguir com sua vida.

Mas a verdade é que ela já tinha passado da lavanderia há muito tempo. Porque no fundo sabia que, assim como muitas coisas na vida, aquela porra ficaria bem guardada. Aquela porra agora era dela, assim como muitas outras que viriam.

Todos sabemos que não podemos lavar certas coisas.

Ou melhor, certas coisas não precisam ser lavadas.